E já lá foi no dia 24 de Setembro, podemos dizer que foi o nossa 1ª caminhada outonal, realizada finalmente na companhia do nosso velho amigo Pxaranha que trouxe o companheiro Dobocage um verdadeiro amante do Gerês!
Devo lembrar que a primeira vez que vimos este último companheiro no Gerês foi em circunstancias curiosas, estando eu a observar o vale de Rocalva, visto da direcção das antenas do Borrageiro, vi um indivíduo no topo da Roca Negra! Acenei com os braços de entusiasmo, nem sabia que era possível trepar aquilo tudo! Encontrámo-nos passado umas horas na Portela de Leonte, o indivíduo era aquele corajoso Dobocage!
Partimos os quatro de Fafião com a promessa que seria um dia em pleno, uma excelente companhia e com muitas novidades a descobrir em conjunto.
Conversas em dia, experiências e aventuras passadas e relembradas, histórias do Gerês, foi o tema de companhia também.
Mas não fosse o mais perfeito de tudo, quando chegámos quase ao cimo das montanhas, calcorreando os primeiros planaltos, vestidos de erva e fetos e urzes serranas, adornados com o seu granítico único e avistarmos a primeira silha dos ursos de um ponto alto e preveligiado.
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Onde está a silha?...onde? |
Já aquela zona pertencia a Pincães, aldeia geresiana situada no sopé da serra do Gerês a cerca de 370 metros.
Mas não estávamos na aldeia, encontrávamo-nos a uns belos metros mais acima a contemplar umas das mais belas silhas dos ursos da serra, num cenário deslumbrante!
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Lá está ela! estão a ver aquele circulo pequeno? |
Sim é verdade, parece já terem existido ursos no nosso Gerês, os vestígios da reacção humana são as suas provas e os registos da sua existência.
Como refere o Manuscrito do Sr. padre Diogo Martins Pereira:
"(...)" é tão antiga esta casa, que já no tempo que havia ursos nestas terras para os defender das suas colmeias os possuidores da casa, fizeram um grande muro que é obra redonda com sua porta fechada e sua parreira, e outras árvores de fruto daquela obra tomou o nome próprio que tem chamado o Muro, por baixo da fonte do Ranhadouro"(...)"
Ficámos a observar a "nossa descoberta", entusiasmados com toda aquela envolvência e continuamos a avançar metros bem mais acima, agora à procura de um dos fojos do lobo existentes na Serra do Gerês. Este seria especial pois encontra-se bem dentro da serra e parece que as vistas de lá de cima são qualquer coisa de especial...
Mas antes de lá chegarmos, devo relembrar que algumas aldeias do Gerês estão ligadas à serra e aos lobos e o seu relacionamento nunca foi muito pacífico. Agora o lobo Ibérico é uma espécie protegida, mas outrora o lobo era considerado um animal feroz e destruidor dos rebanhos, animais domésticos e até alguns de grande porte! O gado bovino consegue formar um circulo com o traseiro para dentro, os cavalos fazem o inverso, já as cabras, ágeis e rápidas como bem sabemos, dispersam-se rapidamente refugiamdo-se no cimo dos penedos.
Já o Homem com a sua inteligência e habilidade, merecedor do cruel engenho que criou formado por duas paredes, partindo ambas de um ponto distante, em forma de V, acabando por se unir formando no local final um buraco disfarçado por mato e ramos,onde o pobre animal caía sendo imediatamente abatido.
Hoje estes monumentos ao abandono, nada mais são do que memórias distantes e esquecidas que só apenas alguns pastores, populações próximas, caminheiros e montanhistas destemidos ousam contemplar!
Ora venham daí:
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Já se avista o muro lá em cima... |
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Cá está ele...vamos segui-lo com cuidado! |
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O fosso é lá em baixo!! |
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A paisagem envolvente faz esquecer o monumento macabro |
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E aí está uma parte dele, reparem em forma de V e termina com um circulo de pedras onde o animal caía na armadilha num piscar de olhos!! |
Preferi perder mais tempo a observar as paisagens neste local...
Sabemos que a caça ao lobo está totalmente proibida em Portugal, mas mesmo assim lá de longe a longe, os poucos lobos famintos existentes, atacam se puderem os animais domésticos e rebanhos, provocando prejuízos e revolta na população. A legislação actual que visa a protecção do Lobo, prevê indemnizações pelas perdas resultantes dos ataques, mas os processos arrastam-se em teias burocráticas ( como tudo no nosso país), que desesperam os lesados!
Mas neste caso em concreto, os habitantes tentam fazer a justiça pelas próprias mãos, tentando envenenar os animais, a meu ver ainda bem pior que os fojos!! Este processo não só pode destruir o animal em causa, que nem sempre é o mais atingido, como ainda mata outros pobres animais inocentes que passeiam pela serra. Que o diga a nossa querida amiga White Angel do blog alma de montanhista...pobre Kelly uma jovem cadelinha que pouco conheceu da vida, e que teve como infelicidade a tentação de apenas lamber uns bocados de entranhas contaminadas na beira de um caminho. Para além de ter sofrido e ter feito sofrer a sua dona, e depois de aparentemente a parte pior já ter sido ultrapassada, acabou por falecer nos braços de Angel meses depois...o seu coraçãozinho não resistiu!
Passando esta triste parte à frente, vamos continuar a observar as paisagens e seguir em frente!
Largamos o local deste fojo que apesar de tudo está bem enquadrado no alto do Sobreiro e bem dentro do Gerês serrano. Existem outros fojos no Gerês, alguns ate bem preservados, como é o caso do fojo bem perto da aldeia de Fafião, mas a todos eles falta-lhes a insolvência que este tem!
Avançando mais para cima e mais para dentro da serra, cada canto era um encanto, cada ponta o canto eleito para paragem do almoço, mas os nossos olhos queriam atingir sempre mais além e as nossas pernas teimavam em andar mais um pouco!!
Cada ponta, cada varanda mais bonita que a outra! " E nós já ficávamos tão bem aqui a almoçar com esta vista!...mas eles ali à frente querem andar mais um pouco!!" Por fim lá concordámos em parar...também pouco mais podíamos avançar, só para o precipício:)
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Sentem-se aqui à nossa beira, e venham sentir o mesmo que nós!!! |
Aqui meus amigos, posso dizer que foi o pico máximo deste dia!
Ali sentados a satisfazer uma necessidade básica da vida, ingerir os alimentos que levávamos, pois sem eles não sobrevivemos. Mas o gozo que nos deu foi aquela vista panorâmica tão rara e única, exclusiva para nós, e não trocávamos pelos restaurantes mais famosos e caros do mundo! Aqueles que até tem pessoas em lista de espera para no fim comer, uma pequena e requintada amostra num prato tão ou mais requintado que o recheio, não desprezando a sabedoria, a arte e a ciência que ali foi aplicado, já para não falar da arte , capacidade e força de vontade que quem se digna a esperar para provar tal novidade, ficando no final com a mente serena e a carteira leve! Deve ser uma sensação muito interessante...mas nós não trocávamos, nem que nos pagassem!!
Dali saímos recheados de satisfação leveza, alegria e felicidade, por termos partilhado em conjunto o mesmo cenário e sentirmos a mesma brisa serrana, sem que a montanha nos tenha pedido nada em troca! Ah! terra abençoada e nós os eleitos!! Não percebem homens o que nos rodeia a natureza e nos entrega, e já basta?!
Depois lá continuámos, mais para cima,mais para dentro, e lá estava outro fojo dos lobos bem maior que o primeiro e este sim estava mesmo completamente esquecido no tempo e quase devorado pelo mato já mais alto que rasteiro.
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O animal de pedra adormecido :) |
Por ali foi só de passagem, outros pontos nos aguardavam e outras paragens nos iriam deliciar.
Subimos mais um pouco as encostas e após uns kms à frente já se avistavam as lagoas do Marinho. Estavam secas, como é próprio da época, e por lá se encontravam gado e e gente. Queria muito ir até lá, possivelmente estava alguém conhecido ou para conhecer, mas tínhamos o tempo quase cronometrado e ainda muito caminho pela frente.
Apanhamos o estradão mas rapidamente virámos para a direita, vale a baixo.
Sensacional e único! Descobrir carreiros pouco frequentados é sempre um desafio para nós. às águas dos ribeiros surgiam do quase nada e a verdura, as encostas, o sol!
Sempre a descer fomos dar com vestígios de pequenos muros já há muito esquecidos e finalmente um vale muito verdinho,mais parecendo um curral num planalto, com três vidoeiros e uma casa bem lá perto, em ruínas!
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Aqui, refrescamos as nossas faces...que bom! |
Mas que local lindo!Perfeito para uma casa na montanha! Mas abandonada?! O que teria acontecido ali?...
Por ali pairámos algum tempo e depois tomámos caminho novamente, mais para o interior da serra, tínhamos de dar saída aquele trilho circular.
Mais tarde o Sr. António Fernando Machado Ribeiro Guimarães, autor do livro "Aldeia de Pincães", leitura que nós recomendamos vivamente, pelo amor que transmite pela terra que o viu nascer e pelo relato, em primeira mão do Gerês do passado recente, elucidou-nos sobre a história da casa: "Está localizada em Taboucinhas. É uma edificação com aproximadamente 60 anos. A história é muito simples: Foi construída por um Senhor que dava pelo nome de Secundino, natural da zona de Leiria e que veio para esta terra como Resinheiro. Outrora a extracção de resina era muito grande nesta zona. Casou ou arranjou companheira e resolveu cultivar terra em Taboucinhas. Não estava lá sempre, vinha para o lugar das Barreirinhas com frequência.".
A partir daqui e a uma quota mais inferior que a inicial, lá procuramos seguir o trilho bem talhado, por vezes manhoso,mas sempre visível.
A parte final é que foi uma aventura um pouco desgastante, mas compensadora, já explico porquê...
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Um falcão?... |
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Havia muitos medronheiros por aqui!! |
Apanhamos um estradão mas tudo indicava que o mesmo iria dar a Pincães, não era para lá que tínhamos de nos dirigir mas sim para Fafião,local onde tinham ficado as nossas viaturas!
Depois de alguns debates e indecisões do trajecto a percorrer, Valeu-nos o GPS que nossos companheiros tinham levado, e Dobogage concluiu que só estávamos a 100 metros de um estradão mais acima e que nos levaria a Fafião...só que tínhamos de subir a pequena encosta a corta mato para chegar ao dito estradão...como é pessoal vamos nessa? Quem andou até aqui, nãi vai desistir em 100 metros!! E lá fomos a corta mato! Mas não foi fácil! Ao longe parece uma coisa mas na realidade era outra, por vezes com o piso manhoso e alguns fundões...tivemos que recuar para outros lados andar em ziguezague, conforme desse mais jeito a cada um! Suámos como cavalos, os 100 metros pareciam kms, mas a satisfação no final foi divinal!!
É preciso ter em conta que nesta altura já estávamos com muitos kms nas pernas e o cansaço já começava a querer apoderar-se de nós!
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finalmente no caminho certo! |
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E encontrámos pelo caminho mais uma silha...esta era mais pequena. |
Chegámos a Fafião depois de umas boas gargalhadas pelo caminho e fomos finalmente beber uma cervejinha bem fresquinha ao café Fojo dos lobos!! O nome nem foi opor acaso!
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Este cachorrinho era uma doçura! veio logo em minha direcção quando chegámos à aldeia! |
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A taça merecida, e com recheio! |
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Só peixinho é que bebeu um Frize...isso é lá bebida de homem duro?! Foi só mesmo para se destacar!! |
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Belo grupo, obrigada pela companhia amigos e esperemos que haja mais aventuras como estas nos próximos capítulos da nossa vida!! |